30 novembro 2011

A árvore dos amigos



Existem pessoas em nossas vidas que nos deixam felizes pelo simples fato de terem cruzado o nosso caminho.
Algumas percorrem ao nosso lado, vendo muitas luas passarem, mas outras apenas vemos entre um passo e outro. A todas elas chamamos de amigo.
Há muitos tipos de amigos. Talvez cada folha de uma árvore caracterize um deles. O primeiro que nasce do broto é o amigo pai e o amigo mãe.
Mostram o que é ter vida. Depois vem o amigo irmão, com quem dividimos o nosso espaço para que ele floresça como nós.
Passamos a conhecer toda a família, à qual desejamos o bem.
Mas o destino nos apresenta outros amigos, que não sabíamos que iam cruzar o nosso caminho. Muitos desses são designados amigos do peito, do coração. São sinceros, são verdadeiros. Sabem quando não estamos bem, sabem o que nos faz feliz...
Às vezes, um desses amigos do peito estala o nosso coração e então é chamado de amigo namorado.
Esse dá brilho aos nossos olhos, música aos nossos lábios, pulos aos nossos pés.
Mas também há aqueles amigos por um tempo, talvez umas férias ou mesmo um dia ou uma hora. Esses costumam colocar muitos sorrisos na nossa face, durante o tempo que estamos por perto.
Falando em perto, não podemos nos esquecer dos amigos distantes, que ficam nas pontas dos galhos, mas que quando o vento sopra, aparecem novamente entre uma folha e outra.
O tempo passa, o verão se vai, o outono se aproxima, e perdemos algumas de nossas folhas. Algumas nascem num outro verão e outras permanecem por muitas estações. Mas o que nos deixa mais feliz é que as que caíram continuam por perto, continuam aumentando a nossa raiz com alegria. Lembranças de momentos maravilhosos enquanto cruzavam o nosso caminho.
Cada pessoa que passa em nossa vida é única. Sempre deixa um pouco de si e leva um pouco de nós. Há os que levaram muito, mas não há os que não deixaram nada.
Esta é a maior responsabilidade de nossa vida e a prova evidente de que duas almas não se encontram por acaso.

25 novembro 2011

Saudade...É o amor que fica !

No início da minha vida profissional, senti-me atraído em tratar crianças, me entusiasmei com a oncologia infantil. Tinha, e tenho ainda hoje, um carinho muito grande por crianças. Elas nos enternecem e nos surpreendem como suas maneiras simples e diretas de ver o mundo, sem meias verdades.

Nós médicos somos treinados para nos sentirmos "deuses".
Só que não o somos! Não acho o sentimento de onipotência de todo ruim, se bem dosado.

É este sentimento que nos impulsiona, que nos ajuda a vencer desafios, a se rebelar contra a morte e a tentar ir sempre mais além. Se mal dosado, porém, este sentimento será de arrogância e prepotência, o que não é bom. Quando perdemos um paciente, voltamos à planície, experimentamos o fracasso e os limites que a ciência nos impõe e entendemos que não somos deuses. Somos forçados a reconhecer nossos limites!

Recordo-me com emoção do Hospital do Câncer de Pernambuco, onde dei meus primeiros passos como profissional. Nesse hospital, comecei a freqüentar a enfermaria infantil, e a me apaixonar pela oncopediatria.

Mas também comecei a vivenciar os dramas dos meus pacientes, particularmente os das crianças, que via como vítimas inocentes desta terrível doença que é o câncer.

Com o nascimento da minha primeira filha, comecei a me acovardar ao ver o sofrimento destas crianças. Até o dia em que um anjo passou por mim.
Meu anjo veio na forma de uma criança já com 11 anos, calejada porém por 2 longos anos de tratamentos nos mais diversos, hospitais, exames, manipulações, injeções, e todos os desconfortos trazidos pelos programas de quimioterapias e radioterapia.

Mas nunca vi meu anjo fraquejar. Já a vi chorar sim, muitas vezes, mas não via fraqueza em seu choro. Via medo em seus olhinhos algumas vezes, e isto é humano! Mas via confiança e determinação. Ela entregava o bracinho à enfermeira, e com uma lágrima nos olhos dizia: faça tia, é preciso para eu ficar boa.

Um dia, cheguei ao hospital de manhã cedinho e encontrei meu anjo sozinho no quarto. Perguntei pela mãe. E comecei a ouvir uma resposta que ainda hoje não consigo contar sem vivenciar profunda emoção.

Meu anjo respondeu:

- Tio, disse-me ela, às vezes minha mãe sai do quarto para chorar escondido nos corredores. Quando eu morrer, acho que ela vai ficar com muita saudade de mim. Mas eu não tenho medo de morrer, tio. Eu não nasci para esta vida!

Pensando no que a morte representava para crianças, que assistem seus heróis morrerem e ressuscitarem nos seriados e filmes, indaguei:

- E o que morte representa para você, minha querida?
- Olha tio, quando a gente é pequena, às vezes, vamos dormir na cama do nosso pai e no outro dia acordamos no nosso quarto, em nossa própria cama não é ?
(Lembrei minhas filhas, na época crianças de 6 e 2 anos, costumavam dormir no meu quarto e após dormirem eu procedia exatamente assim.)
- É isso mesmo, e então?
- Vou explicar o que acontece, continuou ela: Quando nós dormimos, nosso pai vem e nos leva nos braços para o nosso quarto, para nossa cama, não é?
- É isso mesmo querida, você é muito esperta!
- Olha tio, eu não nasci para esta vida! Um dia eu vou dormir e o meu Pai vem me buscar. Vou acordar na casa Dele, na minha vida verdadeira!

Fiquei "entupigaitado". Boquiaberto, não sabia o que dizer. Chocado com o pensamento deste anjinho, com a maturidade que o sofrimento acelerou, com a visão e grande espiritualidade desta criança, fiquei parado, sem ação

- E minha mãe vai ficar com muitas saudades minha, emendou ela.
Emocionado, travado na garganta, contendo uma lágrima e um soluço, perguntei ao meu anjo:
- E o que saudade significa para você, minha querida ?
- Não sabe não tio? Saudade é o amor que fica!

Hoje, aos 53 anos de idade, desafio qualquer um dar uma definição melhor, mais direta e mais simples para a palavra saudade: é o amor que fica!

Um anjo passou por mim...
Foi enviado para me dizer que existe muito mais entre o céu e a terra, do que nos permitimos enxergar. Que geralmente, absolutilizamos tudo que é relativo (carros novos, casas, roupas de grife, jóias) enquanto relativizamos a única coisa absoluta que temos, nossa transcendência.

Meu anjinho já se foi, há longos anos. Mas me deixou uma grande lição, vindo de alguém que jamais pensei, por ser criança e portadora de grave doença, e a quem nunca mais esqueci.
Deixou uma lição que ajudou a melhorar a minha vida, a tentar ser mais humano e carinhoso com meus doentes, a repensar meus valores.

Hoje, quando a noite chega e o céu está limpo, vejo uma linda estrela a quem chamo "meu anjo, que brilha e resplandece no céu. Imagino ser ela, fulgurante em sua nova e eterna casa.

Obrigado anjinho, pela vida bonita que teve, pelas lições que ensinastes, pela ajuda que me destes.

De um artigo do Dr. Rogério Brandão - Médico oncologista clínico.

23 novembro 2011

Sherlock Holmes



Sherlock Holmes

Sherlock Holmes e Watson vão acampar.
Montam a tenda e, depois de uma boa refeição e uma garrafa de vinho, deitam-se para dormir.
Algumas horas depois, Holmes acorda e diz para o seu fiel amigo:

— Meu caro Watson, olhe para cima e diga-me o que vê.

Watson responde:
— Vejo milhares e milhares de estrelas.

Holmes, então, pergunta:
— E o que isso significa?

Watson pondera por um minuto, depois enumera:
1. Astronomicamente, significa que há milhares e milhares de galáxias, e, potencialmente, biliões de planetas.
2. Astrologicamente, observo que Saturno está em Leão e teremos um dia de sorte.
3. Temporalmente, deduzo que são aproximadamente 03 horas e 15minutos pela altura em que se encontra a Estrela Polar.
4. Teologicamente, posso ver que Deus é todo-poderoso e somos pequenos e insignificantes.
5. Meteorologicamente, suspeito que teremos um lindo dia.
Correcto?

Holmes fica um minuto em silêncio e diz:
— Fdssss... Watson, não vês que nos gamaram a puta da tenda?!!...



Moral da história: A vida é simples, nós é que a complicamos.

20 novembro 2011

Solte a panela



Certa vez, um urso faminto perambulava pela floresta em busca de alimento. A época era de escassez, porém, seu faro aguçado sentiu o cheiro de comida e o conduziu a um acampamento de caçadores.

Ao chegar lá, o urso, percebendo que o acampamento estava vazio, foi até a fogueira, ardendo em brasas, e viu que dela haviam tirado um panelão de comida. 

O urso abraçou a panela com toda sua força e enfiou a cabeça dentro dela, devorando tudo. Enquanto abraçava a panela, começou a perceber algo lhe atingindo. Na verdade era o calor da panela. Ele estava sendo queimado nas patas, no peito e por onde mais a panela encostava.

O urso nunca havia experimentado aquela sensação e, então, interpretou as queimaduras pelo seu corpo como uma coisa que queria lhe tirar a comida. Começou a urrar muito alto. E quanto mais alto urrava, mais apertava a panela quente contra seu imenso corpo.

Quanto mais a panela lhe queimava, mais ele apertava contra o seu corpo e mais alto ainda urrava. Quando os caçadores chegaram ao acampamento, encontraram o urso recostado a uma árvore próxima à fogueira, segurando a panela. O urso tinha tantas queimaduras que o fizeram grudar na panela e, seu imenso corpo, mesmo morto, ainda mantinha a expressão de estar urrando.

Quando terminei de ouvir esta história de um mestre, percebi que, em nossa. vida, por muitas vezes, abraçamos certas coisas que julgamos ser importantes.
Algumas delas nos fazem gemer de dor, nos queimam por fora e por dentro e, mesmo assim, ainda as julgamos importantes. 

Temos medo de abandoná-las e esse medo nos coloca numa situação de sofrimento, de desespero.

Apertamos essas coisas contra nossos corações e terminamos derrotados por algo que tanto protegemos, acreditamos e defendemos. 

Para que tudo dê certo em sua vida, é necessário reconhecer, em certos momentos, que nem sempre o que parece salvação vai lhe dar condições de prosseguir. Tenha a coragem e a visão que o urso não teve. Tire de seu caminho tudo aquilo que faz seu coração arder. 

Solte a panela! 

15 novembro 2011

Pormenores, que estragam a foto....

A condenação à forca e o casamento




O casamento para escapar à forca, ou a forca para evitar o casamento


Na Idade Média havia um costume, nalguns países, que consistia em perdoar a pena de morte a um condenado, se este fosse pedido em casamento por uma rapariga. O Código de Justiça Militar francês, em 1668, proibiu que esse costume abrangesse os desertores das tropas. O casamento poderia ser uma forma ardilosa de escapa à forca.
Enforca, enforca!...
Valério Bexiga, no livro «O Juiz e o fariseu» descreve um caso curioso. Terá acontecido algures em França no séc. XVIII. Um contrabandista, condenado à forca, já se encontrava no cadafalso, com o capuz na cabeça e a corda ao pescoço, quando, na assistência, uma mulher grita que queria casar com ele.
A execução é suspensa e a sortuda mulher aproxima-se. Tratava-se de uma mulher feia, coxa e com ar esquisito. Ao ver tal figura, o condenado enfia o capuz na própria cabeça, e grita aflitivamente para o carrasco: «enforca, enforca!...».
Justificação religiosa
Segundo a Igreja, o casamento é um sacramento de tal modo importante que se justifica aquele "perdão" da pena. Só Deus pode dissolver o casamento com a morte natural. O casamento conferia também especial estatuto e era exigido nalgumas profissões. Por exemplo nas Ordenações Afonsinas e Manuelinas dispunha que "casado deve ser o oficial de justiça".
Justificações profanas
Algumas pessoas, para justificar tal costume (perdão da forca se o condenado casasse), diziam que não se tratava de um autêntico perdão de pena, mas sim de uma "pena alternativa". 
O filósofo Séneca (séc. I), ao criticar as condenações à morte decretadas pelo imperador Nero, dizia: "condenados à morte estamos desde que nascemos, e assim, a condenação à morte não é uma verdadeira pena." Talvez por isso, um jurista  chamado Despeisses (séc. XVII) concluía que "o casamento é uma pena mais severa do que a morte".
Casamento e a filosofia
O filósofo Sócrates (séc. IV a.C., casado com Xantipa, que era mulher de mau feitio), dizia aos seus discípulos: "casai-vos, se vos calhar em sorte uma boa mulher, sereis felizes. Se vos couber uma má, sereis filósofos". No mesmo sentido, São Jerónimo (séc. IV) defendeu o celibato por ser o modo de melhor filosofar. E em 1073, o Papa Gregório VII impôs o celibato obrigatório porque "o matrimónio dos sacerdotes é herético e os distraia do serviço ao Senhor", e vários teólogos defendiam que "a sexualidade atrapalha a espiritualidade". Esta perspectiva negativa e "herética" do casamento, acaba por justificar este sacramento como "pena alternativa", embora não tenha sido esse o objectivo da Igreja.
A "forca" nos dias de hoje
Quando temos conhecimento que alguém se casou, é costume dizer-se, na actualidade, em linguagem calão, "enforcou-se". De certeza que este termo calão, ao equiparar o casamento à forca, tem origem naquele costume medieval.
João Luis Gonçalves, Procurador da República no TAFF

09 novembro 2011

Imposto não imposto pago continuamente


No início do séc. XIX, o imposto, para ser legítimo, teria de ter a concordância do próprio povo


"O bom pastor é aquele que tosquia as ovelhas, não o que lhes arranca a pele." 
Imperador Tibério

Origem do imposto O imposto surgiu na História, segundo Cícero (séc I a.C), como "pagamento de prestação periódica dos vencidos de guerra aos vencedores, depois de reduzidos à escravidão. O imposto era, assim, uma obrigação de escravo", escreve Valério Bexiga no seu livro "Cabra que pula a vinha…", 1999.

Inventores de impostos
O imperador Romano Caio Calígula, foi um dos maiores "inventores de impostos". Até criou imposto sobre "as portas" e, no ano 40 d.C., sobre os "lucros da prostituição". Consta que autorizou a prática desta actividade em instalações públicas. Desde que se paguem impostos, tudo é lícito. Cícero, nas célebres "Verrinas", equiparava os pesados impostos do governador Verres, da Sicília, às prestações exigidas aos povos escravizados, por serem tributos absurdos, que delapidaram os cidadãos daquela ilha. O imperador Tibério, que viveu na altura de Cristo, indignado com as constantes queixas das "extorsões fiscais" do governador do Egito, mandou-lhe recado dizendo: "o bom pastor é aquele que tosquia as ovelhas, não o que lhes arranca a pele."

Imitação dos portugueses
Valério Bexiga (in op.cit.) diz que "o sistema fiscal português, dá mostras de algum progresso na senda da inventividade de Caio Calígula". Por exemplo, D.Miguel, em 1832, também decidiu tributar as portas e janelas, tal como havia feito Calígula na antiga Roma. Em Portugal, nos nossos dias, também se tributa o "suborno", diz Valério Bexiga (in op. cit.). Mas, devido à dificuldade de inscrever esta despesa, o governo incluiu a rubrica "despesas não documentadas". Ou seja, tal como o imperador Calígula, a origem e destino do rendimento não interessa, desde pague imposto, tudo é lícito.

"Imposto não imposto"
O advento do liberalismo, início do séc. XIX, veio acentuar a ideia de que o imposto, para ser legítimo, teria de ter a concordância do próprio povo. Como é isto possível? A solução é simples: a aprovação dos impostos fica reservada ao povo, através dos seus representantes eleitos no parlamento. Esta "legalidade formal", na prática, é a que ainda vigora nos nossos dias. O problema é que a legalidade formal é parente afastada da realidade prática.
Conta-se que o intendente Pina Manique recebeu, por decreto real, a concessão dos "serviços de iluminação pública" em Lisboa, no final do séc. XVIII. No entanto, continuou a receber as taxas respectivas (100 réis exigidos a cada morador), mesmo depois de extinguir a prestação do serviço. Mais tarde, constava que as dispendiosas festas, na altura do primeiro parto da rainha Carlota, tinham sido promovidas pelo referido intendente.
Pagar taxas, sem o correspondente serviço prestado ao cidadão é, na verdade, o pior "imposto não imposto" inventado, que se tornou, infelizmente, habitual, desde, pelo menos, final do séc. XVIII.

Dizia Estobeu: "o uso do dinheiro, feito com inteligência, pode contribuir para a generosidade e para o bem do povo; sem inteligência, é um imposto pago continuamente".

João Luís Gonçalves, Procurador da República no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé

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