09 novembro 2011

Imposto não imposto pago continuamente


No início do séc. XIX, o imposto, para ser legítimo, teria de ter a concordância do próprio povo


"O bom pastor é aquele que tosquia as ovelhas, não o que lhes arranca a pele." 
Imperador Tibério

Origem do imposto O imposto surgiu na História, segundo Cícero (séc I a.C), como "pagamento de prestação periódica dos vencidos de guerra aos vencedores, depois de reduzidos à escravidão. O imposto era, assim, uma obrigação de escravo", escreve Valério Bexiga no seu livro "Cabra que pula a vinha…", 1999.

Inventores de impostos
O imperador Romano Caio Calígula, foi um dos maiores "inventores de impostos". Até criou imposto sobre "as portas" e, no ano 40 d.C., sobre os "lucros da prostituição". Consta que autorizou a prática desta actividade em instalações públicas. Desde que se paguem impostos, tudo é lícito. Cícero, nas célebres "Verrinas", equiparava os pesados impostos do governador Verres, da Sicília, às prestações exigidas aos povos escravizados, por serem tributos absurdos, que delapidaram os cidadãos daquela ilha. O imperador Tibério, que viveu na altura de Cristo, indignado com as constantes queixas das "extorsões fiscais" do governador do Egito, mandou-lhe recado dizendo: "o bom pastor é aquele que tosquia as ovelhas, não o que lhes arranca a pele."

Imitação dos portugueses
Valério Bexiga (in op.cit.) diz que "o sistema fiscal português, dá mostras de algum progresso na senda da inventividade de Caio Calígula". Por exemplo, D.Miguel, em 1832, também decidiu tributar as portas e janelas, tal como havia feito Calígula na antiga Roma. Em Portugal, nos nossos dias, também se tributa o "suborno", diz Valério Bexiga (in op. cit.). Mas, devido à dificuldade de inscrever esta despesa, o governo incluiu a rubrica "despesas não documentadas". Ou seja, tal como o imperador Calígula, a origem e destino do rendimento não interessa, desde pague imposto, tudo é lícito.

"Imposto não imposto"
O advento do liberalismo, início do séc. XIX, veio acentuar a ideia de que o imposto, para ser legítimo, teria de ter a concordância do próprio povo. Como é isto possível? A solução é simples: a aprovação dos impostos fica reservada ao povo, através dos seus representantes eleitos no parlamento. Esta "legalidade formal", na prática, é a que ainda vigora nos nossos dias. O problema é que a legalidade formal é parente afastada da realidade prática.
Conta-se que o intendente Pina Manique recebeu, por decreto real, a concessão dos "serviços de iluminação pública" em Lisboa, no final do séc. XVIII. No entanto, continuou a receber as taxas respectivas (100 réis exigidos a cada morador), mesmo depois de extinguir a prestação do serviço. Mais tarde, constava que as dispendiosas festas, na altura do primeiro parto da rainha Carlota, tinham sido promovidas pelo referido intendente.
Pagar taxas, sem o correspondente serviço prestado ao cidadão é, na verdade, o pior "imposto não imposto" inventado, que se tornou, infelizmente, habitual, desde, pelo menos, final do séc. XVIII.

Dizia Estobeu: "o uso do dinheiro, feito com inteligência, pode contribuir para a generosidade e para o bem do povo; sem inteligência, é um imposto pago continuamente".

João Luís Gonçalves, Procurador da República no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé

1 comentário:

Paula Barros disse...

Por aqui estão sempre a criar impostos, e não vemos os serviços melhorarem.

abraços saudosos.

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